Acordamos às 4:00 am para irmos visitar os
templos do antigo império Khmer. Às 4:30 am, conforme combinado, o Tuk Tuk está
à nossa espera à porta do hotel. Parece uma loucura, mas acordar de madrugada
para ver o nascer do sol nos templos é um dos eventos mais concorridos da
cidade.
Angkor Wat
Quando saímos do hotel já há imenso movimento na rua e quando chegamos
à entrada do complexo de Angkor Wat, onde se compram os ingressos, a fila de
gente é enorme. O ingresso para um dia custa 25$. Há ingressos para três dias e
para uma semana, mas para nós não vale a pena, pois amanhã já regressamos a
Phnom Penh. Convenhamos no entanto que é possível passar uma semana só a
visitar templos em Angkor. Há muita coisa para ver e pode, por exemplo optar-se
por fazer a visita de bicicleta, pelo menos nos templos mais próximos.
Os Tuk Tuks têm pré definidos dois percursos,
um mais curto e outro mais longo. O que fizemos foi selecionar os templos que
queríamos ver por ordem de prioridades. Falamos com o nosso amigo e fizemos
logo o plano do que íamos ver durante o dia. Começamos pelo grande Angkor Wat.
Afinal foi esse o motivo de nos levantarmos tão cedo. Passamos a ponte que dá
acesso à entrada e entramos no recinto exterior ainda de noite. Os visitantes
aglomeram-se em cima do lago adjacente ao templo. É aqui que se cria aquele
efeito visual magnífico do templo a refletir na água ao nascer do sol. Enquanto
esperamos pelo sol, os comerciantes instalam-se ali perto a vender artesanato,
pinturas e silhuetas em pele (shadow puppets). Outros tentam vender café para
manter os visitantes acordados.
Depois de arranjar um lugar com o ângulo
ideal, ficamos à espera do sol nascer… e quando este finalmente começa a
despontar, o resultado é surpreendente, todo o céu se mistura com pinceladas de
cores roxo, vermelho e rosa forte que depois se vão transformando em laranja,
lilás e rosa. O reflexo das cores no céu sobre a água dá um efeito de postal e
ficamos uns momentos a assimilar toda aquela fusão de cores espelhadas sobre a
água calma como se estivéssemos a assistir à pintura de uma tela ao vivo e a
cores.
Depois de o sol estar bem presente e
resplandecente, começamos então a nossa visita ao maior e mais importante
templo do complexo. Angkor Wat é um templo de dimensões colossais totalmente
construído em pedra, que é no mínimo curioso, pois pedra não é um recurso que
exista nesta zona e os arqueólogos têm dificuldade em explicar de onde veio
tanta pedra. Vamos subindo e explorando o templo, degrau após degrau , corredor
por corredor, apreciando e fotografando as muitas gravuras em alto relevo de
apsaras dançantes, elefantes, nagas e guerreiros, motivos vegetalistas entre
outros assim como esculturas de leões e nagas seguradas por guerreiros.
A
presença de morcegos é abundante e o cheio em zonas escuras e fechadas chega a
ser muito intenso. Passados cerca de uma hora damos por encerrada a vista a
este templo e dirigimo-nos de volta para o nosso Tuk Tuk. O nosso condutor está
a hibernar dentro do seu “hamok” e temos de o acordar para podermos tirar o
nosso pequeno-almoço de saco que o hotel nos enviou, já habituados a estes
programas matinais. Tomamos o pequeno-almoço com uma vista espetacular à beira
do lago que circunda todo o Angkor Wat.
Angkor Thom (Templo Bayon)
Passamos então para os templos seguintes que
se encontram no complexo Angkor Thom (Angkor Central). Este é composto por vários
templos e também está totalmente circundado de água. A entrada para o complexo
são cinco pontes, três das quais com os famosos guerreiros que em fila seguram
de cada lado nagas gigantes. Os pórticos são arcos com cabeças colossais
viradas para os quatro lados e é comum ver turistas a passear de elefante por
este complexo. O templo Bayon foi o primeiro que visitamos dentro do complexo,
este é conhecido pelas cabeças colossais espalhadas por todo o templo ao jeito
dos pórticos que passamos à entrada. Mais uma vez é todo em pedra com infinitos
baixos-relevos por todo o lado.
Visitamos as restantes estruturas como o
Terrace of the Elefantes, Phimeanakas, Terrace of the Leaper King, Royal
Enclosure, Tep Pranam e Preah Pitu.
De seguida dirigimo-nos à seção Nordeste e
Este de Angkor onde visitamos Preah Khan, Ta Nei, Thommanon, Chao Say Tevoda,
Ta Keo, Srah Srang, Banteay Kdei, entre outros.
Tha Phrom
O último templo do dia é o Tha Phrom que é o
principal responsável por toda esta afluência de visitantes estrangeiros. Foi
aqui que em 2001 Lara Croft encontrou uma rapariga
misteriosa, no filme “Tomb Raider” , numa adaptação ao famoso jogo de
computador. No filme surgem várias imagens de Angkor, como as cabeças do templo
Bayon, mas o que ficou na memória foram as árvores com as suas raízes gigantes
a invadirem o templo Tha Phrom. Apesar de não ter sido a primeira obra
cinematográfica filmada em Angkor (ver Lord Jim, de 1965 com Peter O’Toole),
não há dúvida de que “Lara Croft: Tomb Raider” catapultou este local património
mundial da Unesco para o estrelato.
O Tha Phrom está deveras mal tratado pela
natureza mas paradoxalmente é isso que desperta tanta curiosidade. As árvores
evasivas espalham as suas raízes por tudo o que é pedra, subindo pelos
telhados. Se é verdade que algumas zonas conseguiram resistir às raízes, também
é verdade que outras partes do templo que só se mantêm em pé por causa das
raízes. Estas protegem a estrutura mas isso tem um custo que é o facto de elas
se apropriarem do templo.
Tudo isto cria um efeito espectacular que só
pode ser visto em alguns locais muito especiais. Os visitantes admiram o
resultado desta apropriação natural da natureza pela construção humana. Os
arqueólogos por seu lado não acham muita piada ao sucedido. Um colega nosso
khmer, professor da universidade e um arqueólogo muito conceituado no Camboja,
é o responsável técnico pela zona arqueológica de Angkor. Disse-nos que a
floresta causa um estorvo imensurável ao trabalho no local. Impedem o
reconhecimento de estruturas soterradas e logo o correto levantamento
arqueológico de Angkor. Devido a isso desenvolveram recentemente uma técnica de
levantamento aéreo feita com recurso a laser a qual veio a desvendar uma cidade
perdida de proporções até então desconhecidas (ver artigo).
Exploramos os vários recantos do Tha Phrom,
sempre muito concorrido. Em algumas das árvores mais imponentes os visitantes
fazem fila para tirar fotografias. Algumas partes do templo estão interditas
pois encontram-se em restauração. O passeio entre pedras esculpidas e árvores é
deveras agradável e quando conseguimos encontrar um spot vazio para desfrutar do templo é qualquer coisa de especial. A
maioria dos visitantes porém partem daqui sem notar um detalhe precioso. Não é
de estranhar, já que para encontrar esse detalhe é como procurar uma agulha num
palheiro, a não ser que venham com um bom guia que conheça esse pormenor do
templo. Nós já sabíamos do detalhe antes de cá chegar por isso estamos atentos,
mas mesmo assim temos de pedir auxílio a uma senhora guarda para nos levar até
lá. Trata-se de uma pequena escultura de dinossauro que está num dos pilares
laterais à entrada para uma seção do templo. Mistura-se com outras esculturas
típicas como elefantes, apsaras e outras por isso é necessário um olho mais
atento para dar com ela. Assemelha-se a um estegossauro,
uma espécie de dinossauro herbívoro e quadrúpede que viveu, dizem, no fim do
período Jurássico (145 milhões de anos atrás). Ora o que é curioso nesta
escultura é que Angkor foi construído durante os séculos XII e XIII! Sendo
assim como é que naquele tempo tinham conhecimento dos dinossauros. Ou a
paleontologia é mais antiga do que se pensava e o império khmer já era dotado
desta ciência ou então tinham uma imaginação muito fértil. Existem diversas
teorias para explicar
a escultura, mas não deixa de ser um detalhe interessante a acrescentar à
visita!
Terminamos o passeio pelos templos por volta
das 02:00 pm. Voltamos à cidade e passamos no escritório do nosso amigo Seyha
que nos arranjou bilhetes para um espetáculo de danças tradicionais com jantar
buffet. Fomos descansar um pouco no hotel e o nosso amigo do Tuk Tuk foi a casa
passar algum tempo com a família.
(ver artigo publicado em 2000 durante as filmagens do filme Tomb Raider)
A dança das Apsaras
Ás 06:30 pm o Tuk Tuk vem buscar-nos ao hotel
para nos levar até ao Amazon Angkor um salão onde servem o buffet acompanhado
das danças tradicionais. O espaço enorme tem uma lotação para várias centenas
de pessoas e está bem composto. Para aqui vêm “charters de chineses” todos os
dias. São os principais turistas. A comida é distribuída por várias mesas
gigantes onde os clientes se servem de toda a variedade de iguarias asiáticas. Enquanto
vamos comendo, no palco ao fundo, começa o espetáculo de danças apsaras e
outras tradições. O espetáculo tem a duração aproximada de uma hora e meia e no
final, os visitantes são convidados a subir ao palco para tirarem fotografias
com as bailarinas.
Regressamos ao hotel no Tuk Tuk. Para mim o
dia chega ao fim. As senhoras não resistem a ir fazer um passeio ao mercado
noturno para comprar as últimas quinquilharias.
No dia seguinte partimos para Phnom Penh à
01:30 pm. A viagem é numa carrinha expresso, uma Ford Transit. Tivemos a
“sorte” de ficar no último banco da carrinha, logo em cima das rodas traseiras.
A viagem dura cinco horas e a estrada é metade de alcatrão e metade de terra
batida. Nas partes de terra batida parece que vamos num carrossel, aos saltos
como se não houvesse amanhã! Para ajudar a festa, o ar condicionado não está a
funcionar mas também não se pode abrir as janelas por causa do pó lá fora. Fazemos
uma paragem a meio do caminho em Kampong Thom para descansar e comer alguma coisa.
Ao final da tarde chegamos à capital. Após uma breve análise parece que ainda
temos tudo no sítio por isso estamos prontos para a próxima.