Dia 3 -
Gargantas do Todra
Acordei às 7:15 para fazer uma corrida matinal e ao mesmo tempo
fazer o reconhecimento do local. Como no dia anterior chegamos de noite, a
primeira coisa que fiz quando me levantei foi espreitar pela janela e …
deslumbrar-me. A paisagem árida pautada com o adobe das casas fez-me sentir num
outro mundo, parado no tempo. Sai para correr no desfiladeiro num percurso que
durou apenas 30 minutos. A esta hora da manhã o Todra é só meu. Só quando
fiz o percurso de regresso ao hotel é que começaram a aparecer os primeiros
comerciantes, que atarefados abriam os estaminés espalhados pelo desfiladeiro.
No hotel já se preparavam o pequeno almoço. Como é habitual
serviram-nos as panquecas típicas que acompanham com doce ou mel. A completar
a refeição tivemos ainda direito ao pão, sumo de laranja natural, chá café, leite
e fruta. Um manjar digno de um berbér.
Após a refeição mais importante do dia, saímos para a caminhada à
volta do Todra que durou cerca de 3 horas com subidas de considerado desnível e
consequentes descidas. Depois de um dia inteiro dentro do carro sabe bem
esticar as pernas e ainda para mais, depois de um pequeno almoço destes.
Começamos por subir pelo trilho cortado entre as pedras, deixando
a estrada que nos trouxe ao Todra para traz. Pelo caminho fomos cruzando com
habitantes das montanhas que desciam ao rio com os seus burros para ir buscar
água e mantimentos. A cerca de 1700m de altitude encontramos uma família
que vive numa espécie de pequenas cavernas escavadas na montanha. No exterior
de uma delas, um homem lavava uns copos numa espécie de chafurdice, talvez para
oferecer um chá aos turistas que por ali passam habitualmente. As condições em
que estas pessoas vivem são impressionantes, numa zona tão remota onde apenas
existem pedras! Estas servem também para construir os muros dos currais dos burros,
que são o único meio de transporte aqui e por isso estimados. Parece que esta
família escolheu o topo da montanha para habitar e depois do nosso encontro,
seguimos em sentido descendente na direção do palmeiral, contrastando com a
paisagem rochosa até então. Neste trajeto encontramos um grupo de Norte
Americanos que tentaram durante alguns minutos identificar a nossa origem
enquanto conversávamos. Acabamos por meter conversa e explicar a origem do
“dialecto” que empregávamos nestas terras Marroquinas. Afinal bem vistas as
coisas nós éramos mesmo ali de cima, comparados com eles que tiveram de cruzar
o Atlântico para chegar ao Norte de África. Descemos passando por uma Kasbah e
entramos pelo pequeno palmeiral que é o único sitio onde se consegue plantar alguma
coisa e ver a cor verde no meio de todo o castanho árido característico desta
povoação do Médio Atlas.
Terminamos a caminhada de novo no hotel “Le Ciel Bleu” que é o
único edifício da aldeia de cor branca, uma propriedade recuperada pela família
há uns 3 anos atrás e que desde essa altura tem funcionado como hotel.
Arrumamos a trouxa, despedimo-nos do staff seguimos viagem para sul, rumo a
Tinghir, a maior cidade das redondezas, que serve de base para explorar a zona
do Todra. Desde as gargantas até à cidade a estrada está esburacada, logo a
velocidade tem de ser reduzida, o que nos permite apreciar as várias aldeias
por onde passamos e as os palmeirais que perfilam ao longo do percurso. Paramos
pelo caminho, à beira da estrada, para fotografar uma grande cidade abandonada
em terracota. Entre nós e a cidade estende-se um imenso palmeiral, em jeito de
provocação perante a paisagem árida, que dá um ar magnifico à paisagem. Os
palmeirais são as únicas zonas verdes que se encontram nesta região árida e é aqui
que vimos algumas plantações locais. Afinal, já estamos perto do deserto e a
água começa a escassear no solo.
Seguimos para Tinghir. À chegada encontramos uma cidade caótica,
com as ruas todas em obras, pó e pedras por todo o lado, mas nem mesmo assim os
habitantes locais deixaram de estar em festa. Na praça central da cidade
decorria um certo evento, que não conseguimos identificar, que juntava centenas
de pessoas, as quais sem espaço na praça, espalhavam-se pela estrada, tornando
o trânsito “ligeiramente complicado”. Estivemos na cidade apenas o tempo
suficiente para levantar dinheiro e prosseguir a viagem. Esta noite ainda não
temos onde dormir, por isso temos de nos pôr ao caminho.
A próxima paragem é a cidade de Goulmima, onde pretendemos visitar
a Ksar Ait Goulmima. Á hora que chegamos, já de noite, não conseguimos ver nada
e o melhor é começar a procurar sitio para dormir. No Lonely Planet encontramos
um local descrito como o Éden em África! Imperdível portanto. Seguimos o GPS
por uma estrada de terra que vai encurtando a cada quilómetro que avançamos.
Quando damos por nós, estamos atravessar pontes por cima de pequenos canais
coladas a casa de habitação. No silêncio da noite, somos surpreendidos por um
casa que ao perceberem o que procuramos, nos alertam que estamos a ir no
sentido contrário e lá nos orientam até à "Chez Pauline", o dito Éden. Chegamos à
entrada e ligamos para a proprietária que nos veio abrir o portão muito
espantada por receber hóspedes àquela hora. Como se trata de uma Guest House e
não um hotel, trabalham com marcações. Ora vá-se lá saber estes procedimentos
do Éden! Apesar do espanto, a senhora teve a amabilidade de nos mostrar as
instalações, embora tenhamos logo percebido que não tinha muita vontade em
receber 12 pessoas àquela hora da noite. Se algumas dúvidas restassem, ficamos
esclarecidos quanto à sua postura, quando nos disse o preço dos quartos, 10
vezes mais do que o anunciado no livro. Deixamos assim o jardim do
Éden, voltando a Marrocos. Continuamos viagem para Erfoud, a porta do Sahara.
Erfoud é a maior cidade Marroquina junto ao deserto, na fronteira
com a Argélia e fica a cerca de 40 Km de Merzouga. Paramos num hotel à beira da
estrada para saber os preços e ficamos logo a perceber que aqui até o hotel se
negoceia. Depois de perguntamos os preços na recepção do Hotel Kasbab Tizimi e quando nos preparamos para entrar nos carros, veio um
senhor atrás de nós para negociar. Tentamos espremer ao máximo, já que éramos
muitos, para que nos dessem o jantar, mas ele ficou-se pelo pequeno almoço. O
hotel tem muito bom aspeto e todos gostaram e quiseram logo ficar ali. Foi sem
dúvida o melhor por onde já passamos nesta viagem, mas como foi o primeiro logo
às portas da cidade, decidimos (a muito custo para a maioria do grupo) ir fazer
um breve estudo de mercado para termos uma noção dos valores. Em Marrocos
quando pensamos que estamos a fazer um bom negocio, muitas vezes descobrimos
mais à frente que afinal o preço não é anda de especial e ainda conseguíamos um
preço melhor pela mesma coisa. Demos uma volta pela cidade e fomos a mais dois
hotéis. O procedimento é idêntico, lançam um preço e depois acabam por fazer
uma “oferta especial”. Os preços que encontramos foram idênticos e como não há
amor como o primeiro, acabamos por pernoitar no Kasbab Tizimi.
